As comemorações anuais dos festejos da Boa Morte são realizadas no mês de agosto, alcançando seu ponto mais alto no dia 15. Tudo se inicia, no entanto, algum tempo antes, no último dia de julho, quando uma comitiva das irmãs, vestidas à caráter, de torço, com batas brancas e saias rodadas da mesma cor, se desloca até a casa da Provedora com o intuito de buscar a imagem de Nossa Senhora. No interior da residência, em um quarto reservado, encontra-se a Virgem.
Vanhise da Silva Ribeiro, que fez detalhado acompanhamento dos festejos no sua já mencionada dissertação intitulada “ Tessituras da Fé”, registra esse momento inaugural: “ Na mesa, coberta com tecido branco, repousa o nicho com a imagem da santa, uma vela mantém a chama acesa, há também um vaso com flores naturais, deixdo ao lado do nicho. Sobre eles, flores de tecido e um pano bordado, que deixa apenas visível o busto da imagem. Pequena e de feições delicadas e doces, a imagem da virgem parece se aventurar numa dormição serena.” Trata-se de uma relíquia da instituição, seu maior patrimônio, datado do século XVIII.
Como primeiro ato da parte pública da festa, o cortejo chama a atenção de todos, alvi-negro agrupamento feminino acompanhado de perto por pessoas ligadas ao candomblé. Pipocas e arroz são atirados sobre elas num rito marcado pelo acentuado aroma de alfazema e muita emoção. Passam, em primeiro lugar, pela sede da Irmandade, onde, em rito reservado a elas e fechado ao público, se demoram alguns minutos, após os quais abrem as portas da casa e oferecem alfazema aos acompanhantes. Daí, seguem para a Ajuda com o esquife da dormição.
Aí ele é enfeitado com flores e ficará até o dia 13 de agosto, quando a imagem sairá em cortejo público dando início à programação religiosa propriamente dita. Entre os dias 12 e 18 de agosto, todas as confrades estarão confinadas na sede da Irmandade, e só retornarão para suas residências após o término dos festejos.
O calendário católico da festa se inicia no dia 13, dia dedicado às irmãs falecidas. Pela tarde, relata documento do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural, as irmãs se confessam na sede da Irmandade; já à noite, dirigem-se com velas sobre pedestal à Capela de Nossa Senhora D´Ajuda, onde rezam e incensam o ambiente em torno da imagem de Nossa Senhora. Vestidas de branco. Dali, saem carregando a imagem postada sobre um andor rumo a Capela da sede da Irmandade, onde se realiza a missa dedicada às irmãs falecidas. Antes, esse mesmo cortejo passava pela Casa Estrela e pela casa da Juíza Perpétua Zuleika Macahado, onde se prestava uma reverência a esses espaços simbólicos de relevância para as irmãs, após o que era realizada a missa na Igreja Matriz.
No dia 14, dia do enterro simbólico, com a imagem de Nossa Senhora da Boa Morte no interior da Igreja, a Irmandade se desloca da sua sede em procissão noturna iluminada por velas e vestidas à caráter: traje de gala com as cores preto e branco, saia plissada e blusa branca de manga, lenço branco na cintura e uma chinela branca entoando o hino católico “No céu/No céu/Com minha Mãe estarei…”
Finalmente, no dia 15, terceiro e mais esperado, dia de Nossa Senhora da Glória, que festeja o mistério da assunção, o cortejo sai pela manhã da Irmandade, por volta das 10 horas, e se dirige à Igreja Matriz, onde os fiéis adentram sob o agradável aroma do incenso. Trajando novamente a roupa de gala e dessa vez enriquecida da cor vermelha do pano da costa, significando alegria pelo vivo da cor, além, de referência às cores de Omolu ( vermelho e preto ) e Iansã ( vermelho ), as irmãs portam muitas joias e balangandãs, manifesta alusão a Oxum, de acordo com Rubens Rocha, sincretizada no candomblé com Nossa Senhora da Glória. Na saída da procissão, sob forte emoção, as irmãs derramam flores sobre a imagem de Nossa Senhora da Glória sob muitos aplausos e vivas, dando início a longo cortejo que, após percorrer várias ruas, retorna à Capela da Irmandade, onde em nova cerimônia acontece a transferência interna de cargos na Irmandade e se empossa a nova comissão responsável pelos festejos do ano seguinte.